quinta-feira, 1 de julho de 2010

Na novela do vice, PSDB e DEM saíram perdendo

O desfecho do processo de escolha do candidato a vice-presidente na chapa do PSDB não teve propriamente vencidos e vencedores. Todos perderam.

É claro que a visão da superfície é a de que José Serra cedeu ao DEM ao aceitar um demista como vice. O DEM ganhou, então, certo? Não, errado.


Não ganha quase nada um partido que vê um deputado federal seu de pouca expressão ser colocado no papel de vice. O DEM não teve a menor influência na escolha do nome de Índio da Costa. A conjuntura –não controlada pelos demistas– é que desembocou em Índio.

Terminada a novela “Álvaro, l breve”, o PSDB e o publicitário Luiz Gonzalez à frente queriam encontrar alguém “filiado ao DEM, que tivesse a imagem de honesto e fosse uma novidade”, nas palavras de um tucano. Outro fez uma anedota: “Essa condição era quase um conjunto vazio”. Mas chegou-se ao nome de Índio da Costa, deputado de 39 anos, do Rio de Janeiro e em seu primeiro mandato.

O nome de Índio da Costa foi, portanto, uma imposição do PSDB. Assim: “O vice vai ser do DEM, mas quem escolhe sou eu e vocês engolem”. Pode-se dizer então que Serra prevaleceu, ganhou? Não. O tucano equivocou-se de maneira quase inacreditável ao acreditar nos seus conselheiros mais próximos a respeito da escolha anterior –o senador Álvaro Dias (PSDB-PR), que foi o candidato a vice-presidente do final de sexta-feira (25.jun.2010) até o começo da tarde de quarta-feira, ontem (30.jun.2010).

Como Serra não conseguiu arrastar Aécio Neves para o cargo de vice-presidente, prevaleceu a noção de que as outras opções eram todas de menor relevância no sentido de trazer um impacto nacional. Essa premissa verdadeira levou a uma ação errada. Escolheu-se Álvaro Dias porque, pelo raciocínio tucano, Serra estaria pelo menos selando uma aliança fortíssima no Paraná –um Estado relevante da região Sul, com expressivos 5,63% dos eleitores do país.

Serra não fez sozinho a escolha Álvaro Dias como vice. Também tiveram relevância na hora de a decisão ser tomada o presidente nacional do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), e o deputado federal Jutahy Júnior (PSDB-BA), cuja função na campanha é ser um dos mais fiéis aliados de Serra.

Qual era a lógica (que estava completamente errada)? Álvaro como candidato a vice-presidente amarraria o apoio de seu irmão, o também senador Osmar Dias (PDT-PR), para o candidato do PSDB ao governo do Paraná, o ex-prefeito de Curitiba, Beto Richa.

Nessa fórmula, Osmar Dias seria candidato à reeleição ao Senado numa aliança com Beto Richa . Formar-se-ia uma “coalizão dos sonhos” no Paraná, isolando o PT. A candidata de Lula ao Planalto, Dilma Rousseff, ficaria sem um palanque viável na disputa pelo governo paranaense.

Deu tudo errado. Para começar, os tucanos exercitaram sua provebial soberba. Permitiram que a decisão vazasse da pior forma possível: pelo Twitter de Roberto Jefferson, deputado cassado por causa do escândalo do mensalão. O DEM chiou e Jefferson respondeu com seu estilo arranca-toco: “O DEM é uma merda!!!”. Enquanto isso, os tucanos assistiam ao degradante espetáculo em estado de catatonia.

A reação retórica do DEM ameaçando romper a aliança foi o menor dos problemas para José Serra. Grave mesmo foi Serra e a cúpula do PSDB não terem avaliado corretamente o grau de animosidade (histórico) entre os irmãos Álvaro e Osmar Dias. Não foram capazes de antever o problema, visível a olho nu para qualquer um que circula pelo salões de carpete azul e encardido do Senado.

Deu a lógica.

Mesmo com seu irmão ainda sendo o candidato a vice-presidente de Serra, na noite de terça-feira, dia 29.jun.2010, Osmar Dias flopou. Anunciou ser candidato ao governo do Paraná, com o apoio do PT –e apoiando a petista Dilma Rousseff para presidente.

Por volta das 23h00 de terça-feira, todos os serviços de notícias online já publicavam textos demolidores: “Irmão do vice de Serra será candidato ao governo do Paraná e vai apoiar Dilma (PT) para presidente”.

Até a eclosão dessa notícia da defecção de Osmar Dias se materializar na noite de terça-feira, o cenário era o seguinte: 1) a cúpula do DEM estava reunida na residência do senador Heráclito Fortes (DEM-PI), em Brasília, em clima de velório; 2) os demistas estavam dando de barato que não teriam como impor a Serra a derrubada de Álvaro Dias do cargo de vice-presidente. Procuravam um discurso para explicar publicamente porque novamente estavam se humilhando para os tucanos; 3) Serra, em São Paulo, negociava um discurso conciliador para fazer uma afago público no DEM. Seria “um apelo em nome do Brasil” ou outra platitude do gênero usada nessas horas.

Aí os demistas foram salvos por Osmar Dias. Ao embaralhar todo o cenário paranaense as coisas ficaram complicadas para Serra. Não fazia mais sentido manter Álvaro Dias como candidato a vice –ele não tinha sido capaz de unir a política paranaense em torno do projeto presidencial de Serra.

A cúpula tucana ainda tentou falar com Osmar Dias na noite de terça para quarta-feira. O deputado Jutahy Júnior não teve sucesso. Osmar Dias não o atendeu.

Em certa medida, esse episódio revela como a candidatura de Serra está limitada “na política”, como se diz em Brasília. Erros são cometidos em uma campanha. OK. Mas esse da indicação de Álvaro Dias como candidato a vice-presidente parece estar no ponto mais alto na escala da ingenuidade no mundo da “Realpolitk”.

Bagunça instalada, na “noite de São Bartolomeu” de terça (29.jun) para quarta (30.jun), Serra enfurnou-se em sua casa em São Paulo com dois demistas –Gilberto Kassab, prefeito de São Paulo, e Rodrigo Maia, presidente nacional do DEM– e com Aécio Neves, que viajou às pressas de Belo Horizonte para a capital paulista.

Até por volta das 5h30 da madrugada de quarta-feira (30.jun), alguns dizem até 6h, Serra analisou todas as hipóteses à sua frente. Nada decidiu, exceto que Álvaro Dias teria mesmo de ser descartado. Para escolher o nome do substituto, aquiesceu que poderia ser alguém do DEM –afinal, não faria muita diferença àquela altura a filiação partidária do escolhido. Uma lista de deputados e de senadores demistas foi apresentada. Cada nome foi escrutinado na manhã de quarta-feira.

A escolha de Índio da Costa não foi, portanto, uma vitória do DEM nem uma derrota de Serra. Foram as circunstâncias que engolfaram demistas e tucanos. Todos perderam.

O DEM não está um centímetro maior nem mais forte por causa da indicação de seu deputado Índio da Costa como vice de Serra. Se Serra vier a ganhar, o papel do DEM no futuro governo será idêntico ao que teria sido mesmo com o tucano Álvaro Dias como vice –muitos cargos espalhados na Esplanada. Se Serra perder, rapidamente será esquecido que houve algum dia um demista como vice.

Alguém se lembra do nome do candidato a vice-presidente na chapa derrotada de Geraldo Alckmin ao Planalto em 2006? Ou o nome de vice na chapa perdedora de Serra em 2002? Bolsa memória: em 2002, Serra teve consigo Rita Camata (então no PMDB e indicada por força do marqueteiro Nizan Guanaes, que defendia “o nome de uma mulher”). Em 2006, o vice de Alckmin foi José Jorge (então senador pelo DEM, à época PFL, de Pernambuco).

O saldo do episódio da escolha do vice é que DEM e PSDB, sobretudo o PSDB e Serra, gastaram energia inútil com um assunto que poderia ter sido resolvido “na política”, muito mais facilmente, sem crise.

Essa inabilidade política toda pode ter sido provocada por dois fatores principais. Primeiro, porque os tucanos talvez sejam mesmo ruins “de política”. Foram forjados por uma conjuntura econômica (o Plano Real, em 1994) e nunca tiveram realmente o dom para a grande arte da negociação. O segundo fator é que quando uma campanha começa a ter problemas... outros problemas nascem quase por geração espontânea.

Tudo considerado e bem pesado, a chapa de oposição Serra-Índio não passa por um bom momento. Nada está decidido na disputa pelo Palácio do Planalto. É verdade. Mas erros políticos como esse da novela “Álvaro, o breve” podem causar o naufrágio completo num estágio mais avançado da campanha
Por Fernando Rodrigues

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